segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Desvios de linguagem: é preciso agir rápido.

O diagnóstico precoce é fundamental para corrigir problemas como gagueira e troca de letras.

"Meu filho trocou o 'L' pelo 'U' logo que começou a falar. A gente até brincava, lá em casa, que ele nunca poderia arrumar uma namorada chamada Lili quando crescesse, porque não ia conseguir dizer o nome dela", conta, rindo, a advogada Vera Maria, mãe de Tiago Silveira, que agora tem 5 anos e -- felizmente -- já pode namorar uma Lili.

Foi necessário um ano de tratamento com exercícios diários, feitos sob a orientação de uma fonoaudióloga, para que Tiago superasse seu problema e conseguisse dizer "bola" em vez de "boua". O final feliz dessa história só aconteceu porque Vera detectou o problema logo no início e não titubeou: levou o menino a um otorrino que pediu alguns exames e, em seguida, o encaminhou para uma fonoaudióloga.

Desenvolvimento. O diagnóstico precoce é, sem dúvida, a melhor forma de prevenir ou corrigir mais rapidamente problemas de linguagem e é por isso que os especialistas alertam os pais sobre a necessidade de ficar atento às crianças quando elas começam a falar. Só que, para descobrir o que está errado, é preciso entender como é o desenvolvimento normal da linguagem a partir do momento em que o bebê começa a balbuciar os primeiros "gugu", "dada", "papa", "mama".

Ele usa esses fonemas indiscriminadamente, sem definição de significado: "au-au" pode significar tanto cachorro, quanto gato ou brinquedo. Só um pouco mais tarde é que aprende a aplicá-los corretamente: "au-au" para o cachorro, "miau" para o gato, "cocó" para a galinha, e assim por diante.

Por volta dos dois anos, a criança já consegue dizer algumas palavras simples para pedir coisas, mas é entre os 2 e 3 anos, que acontece o boom do vocabulário. Segundo algumas pesquisas, nessa fase, a criança aprende de 5 a 10 palavras por dia. Com o aumento de repertório, vai deixando de ser monofrásica - ou seja, de usar apenas uma palavra como se fosse uma frase.

Começa a juntar duas ou três: "Mama, dá bola". É nesse período, ainda, que faz as primeiras tentativas de conjugar verbos: "eu fazeu, eu fizi, eu fazi, eu fiz". Todo esse processo culmina com a tagarelice própria dos 3, 4 anos, embora possa haver, ainda, pequenas dificuldades a superar.

É o caso do "r" e de alguns fonemas como o "que" e o "gue", mais difíceis, já que pedem o uso da parte posterior da língua (os mais fáceis são os que exigem o uso da parte anterior da língua, caso das letras "b", "t", "m").

Os problemas. É, portanto, a partir do segundo ano que podem começar a se evidenciar alguns distúrbios de linguagem. E é fundamental saber reconhecer essas dificuldades. Confira.

Com dois anos

  • A criança não fala nem tem uma "atitude comunicativa". Ou seja, não parece ligada ao ambiente que a cerca.
  • Fala de forma incompreensível, pronuncia sons que não significam nada, ninguém entende o que ela quer dizer.

Entre dois e três

  • Continua falando como um bebezinho, seguindo a fórmula onomatopáica, dizendo "au-au", "piu-piu".
  • Não passa pelo boom de vocabulário previsto nessa fase. Não sabe palavras relativas a espaço, tempo, cor, forma, tamanho.

Com 3 anos completos

  • Ainda não saiu da fase do tatibitate, quando troca o "b", "t" e "d" por outras letras. Bola ainda é pola, dominó sai tominó.
  • Demonstra dificuldade para passar, numa mesma palavra, dos sons produzidos pela parte posterior da língua para os produzidos pela parte anterior, ou vice-versa. Exemplo: em vez de tartaruga, diz tataluda; gato vira dato etc.
  • Dá os primeiros sinais de gagueira, que pode se caracterizar tanto por pausas longas no discurso, quanto pelo prolongamento ou repetições de fonemas e palavras.

As causas. Existem vários fatores que podem provocar esses desvios. Os mais evidentes são detectados pelo pediatra quando a criança nasce ou nos primeiros meses de vida e vêm associados a atrasos no desenvolvimento motor e cognitivo. Estão nesse grupo os problemas de origem neurológica ou congênita, e aqueles provocados por traumatismos na cabeça ou intoxicação medicamentosa.

Problemas de linguagem podem ser também resultado de mal-formações dos órgãos fonoarticulatórios, caso da boca, do palato (céu da boca) ou do véu palatino (a chamada campainha) ou, então, desencadeados por flacidez muscular, provocada por hábitos como respirar pela boca ou usar a chupeta por mais tempo do que devia.

A surdez é outra causa muito comum. E não apenas entre as crianças que já nascem com a deficiência. Aquelas que têm otites, rinites e infecções freqüentes das vias superiores podem apresentar pequenas perdas de audição que, mesmo temporárias, interferem no desenvolvimento da comunicação.

Por último, existe o grupo das causas psiquiátricas e/ou psicológicas. É o caso da síndrome do autismo, da predisposição genética à gagueira, dos episódios de internação hospitalar prolongada, da quebra de vínculos afetivos. Crianças que vivem muito isoladas, com pouca estimulação, também costumam apresentar atrasos na linguagem.

A avaliação. Para chegarem ao diagnóstico, os médicos e fonoaudiólogos fazem um levantamento completo do histórico da criança e aplicam testes para verificar vocabulário, articulação, o uso que faz da linguagem, a fluência para o padrão de sua idade. Somente então se define qual o melhor tratamento. Muitas vezes, o que a criança precisa é só de um pouco mais de tempo e atenção da família. Mas, de acordo com o grau de comprometimento e das causas do atraso, pode ser necessário encaminhá-la para uma equipe multidisciplinar, formada por pediatras, fisioterapeutas e fonoaudiólogos.

Fontes: Debora Maria Befi, fonoaudióloga, professora da Faculdade de Medicina da USP; Jacy Perissinoto, da Universidade Federal de São Paulo; Laura Wey Märtz, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.


A melhor atitude


Saiba como agir para não agravar os problemas de linguagem de sua criança.

  • Nunca ridicularize ou aponte os erros quando ela fala. Tampouco imite-os, mesmo que na hora pareçam engraçadinhos.
  • Não brigue com a criança porque ela fala errado nem se apresse a corrigi-la. Não fale por ela, mas com ela.
  • Use vocabulário adequado para a idade, evitando conceitos abstratos.
  • Lembre que brincadeiras e jogos favorecem a aquisição de conteúdo e o desenvolvimento da linguagem.
  • Estimule seu filho a participar das atividades da casa e vá dando nome aos objetos que o cercam.
  • Dê atenção a seu filho quando ele fala. Muitas vezes a criança engole sílabas, fala de forma incompreensível ou gagueja por medo de que o adulto não preste atenção no que ela está dizendo.

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